Lei que instituiu contribuições previdenciárias por Poderes sobre proventos de inativos é declarada inconstitucional.

O Pleno do Tribunal de Justiça do RN, à unanimidade de votos, declarou a inconstitucionalidade formal da Lei Complementar Estadual nº 623/2018, que alterou dispositivos da LCE n.º 308/2005, reestruturando o Regime Próprio de Previdência Social (RPPS) do Estado do Rio Grande do Norte. A alteração instituiu a contribuição a cargo do Judiciário, do Legislativo (incluído o TCE/RN) e do Ministério Público incidente sobre os proventos dos respectivos servidores inativos e pensões dos dependentes dos seus servidores.
Ação
Diante da mudança, o Procurador-Geral de Justiça propôs Ação Direta de Inconstitucionalidade da Lei Complementar Estadual nº 623/2018 alegando que vigora, desde a Emenda Constitucional nº 41/2003, o princípio da unicidade de regime e gestão do sistema previdenciário, sendo o Instituto de Previdência dos Servidores do Estado do Rio Grande do Norte (IPERN) o gestor único do RPPS no âmbito estadual.
Defendeu que a lei impugnada, em rota de colisão com o preceito legal exposto no artigo 29, § 22, da Constituição Estadual, repassou aos titulares do Poder Judiciário, Poder Legislativo, nele incluído o Tribunal de Contas do Estado, e Ministério Público parte da atividade de gestão do regime previdenciário.
Para o PGJ, a LCE nº 623/2018 pretende repassar a outros Poderes/Órgãos a responsabilidade pelo pagamento da contribuição incidente sobre os proventos dos servidores inativos e as pensões dos dependentes de seus servidores, ou seja, a chamada contribuição patronal. Segundo ele, tal responsabilidade é inerente à atividade de gestão dos variados componentes do regime, de forma que não podem ser distribuídos entre outras entidades/órgãos, sob pena de violação ao princípio constitucional da unicidade de regime e gestão do sistema previdenciário.
O Procurador-Geral explicou que, segundo o sistema constitucional de repartição de competências, o Estado do Rio Grande do Norte somente pode editar normas que suplementem a legislação federal sobre regras gerais de previdência social, sendo-lhe vedado disciplinar a matéria de modo diverso ou inovar sem amparo em norma federal. Assim, para ele, a LCE nº 623/2018 transbordou os limites permitidos pela norma geral nacional que rege o tema (Lei nº 9.717/1998).
Por fim, defendeu que o art. 2.º, § 1.º, da Lei n.º 9.917/1998 prescreve que o Estado é o responsável pela cobertura de eventuais insuficiências financeiras do seu RPPS, mas a lei impugnada, contrariando tal preceito, repassa uma obrigação que cabe ao ente federativo (Estado do Rio Grande do Norte) para os demais Poderes e para o Ministério Público, no que, na sua visão, inovou na ordem jurídica, incidindo em inconstitucionalidade formal por usurpar competência reservada à lei federal, sendo, pois, incompatível com o que dispõe o art. 20, XII, da CE.
Voto
Ao analisar a matéria, o desembargador Amílcar Maia entendeu que a LCE nº 623/2018 de fato usurpou competência legislativa reservada à lei federal, pois não se limitou a suplementar a regulação já existente (Lei n.º 9.717/1998), realizando inadmissível inovação, em ofensa ao que dispõe o art. 20, XII, e § 1.º da CE.
No entanto, o relator compreendeu que a inovação em questão não se constitui no repasse de uma obrigação que caberia ao ente federativo (Estado do Rio Grande do Norte) para os demais Poderes e para o Ministério Público – interpretação que, para ele, não parece ser possível extrair do texto legal sob análise –, mas sim no fato de que a LCE n.º 623/2018 criou fonte de custeio para o regime previdenciário não prevista na Lei n.º 9.717/1998.
Da mesma forma, o desembargador Amílcar Maia não observou ofensa ao artigo 29, § 22, da CE por parte da LCE n.º 623/2018, pois também não compreendeu que ela feriu o princípio da unicidade de regime e gestão do sistema previdenciário, eis que no preceito impugnado não há qualquer indicação de que o RPPS/RN vá ser dividido, retirando-se competências do seu gestor, o IPERN.
Explicou que, de acordo com o sistema constitucional de repartição de competências, cabe à União legislar sobre normas gerais atinentes à previdência social e, aos Estados, exercer a competência legislativa suplementar, podendo editar normas que complementem a legislação federal sobre previdência social, mas não que colidam com esta ou que tragam inovações não previstas nela.
Disse que o teor da lei estadual deve, por exigência do dispositivo constitucional estadual, moldar-se conforme as normas gerais preconizadas pela União. “Logo, o legislador estadual, ao se afastar dos critérios fixados na Lei n.º 9.717/1998, terminou por usurpar a competência legislativa da União, ofendendo diretamente ao disposto no § 1.º do art. 20 da CE, pois ultrapassou os limites de sua competência suplementar para legislar sobre previdência social (art. 20, XII, da CE)”, concluiu.
(Processo nº 0802234-60.2018.8.20.0000)

Fonte: Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte