Desembargador suspende parte de decreto estadual que flexibiliza contenção do coronavírus.

31/03/2020

O desembargador do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, Orlando de Almeida Perri, determinou a suspensão de disposições contidas no Decreto Estadual nº 425/2020, do Governo do Estado, que flexibilizava regras de prevenção à contaminação pelo coronavírus. O desembargador acolheu, em parte, Mandado de Segurança interposto pela Prefeitura de Cuiabá, que, entre outras razões, afirmou não estar preparada para atender um surto epidêmico da doença. A decisão do magistrado vale apenas para o município de Cuiabá e o mérito será analisado pelo colegiado.

Com a decisão, ficam suspensos os incisos I e II do artigo 3º do referido decreto, que permitiam, sob determinadas circunstâncias, o transporte coletivo municipal, metropolitano, serviços de táxi e aplicativo. Também os incisos XXXIX, LX e LXII do artigo 4º, que liberavam o funcionamento de concessionárias de veículos; shopping centers, lojas de departamento, galerias e congêneres; além de outros estabelecimentos comerciais, garantidas as normas de segurança, prevenção e combate ao coronavírus.

Foram suspensas ainda outras duas disposições do decreto: o parágrafo 2º do artigo 8, que deliberava sobre a competência da Polícia Militar em dar apoio operacional exclusivamente para o cumprimento do decreto e o artigo 13, que trazia que as normas dispostas no decreto vinculam os municípios, que somente podem adotar medidas não farmacológicas mais restritivas mediante fundamentação técnico-científica que justifique a providência no âmbito local.

No Mandado de Segurança, a Prefeitura de Cuiabá atestou que o Decreto Estadual nº 425/2020 diverge do Decreto Municipal nº 7.849/2020, alterado pelo Decreto nº 7.850/2020, acerca da possibilidade de funcionamento de determinadas atividades comerciais e forma da prestação de serviços, sendo que as normas municipais se apresentam mais restritivas que as estaduais. O decreto estadual contraria ainda nota expedida pela Sociedade Brasileira de Infectologia – SBI, em 24/03/2020, “que alerta para a necessidade de manutenção das medidas de restrição recomendadas pelo Ministério da Saúde”.

Na nota, a SBI informa que o Brasil está numa curva crescente de casos, com transmissão comunitária do vírus e o número de infectados está dobrando a cada três dias. “A leitura da sobredita nota é suficiente para verificar que o Decreto Estadual vai de encontro às orientações da Sociedade Brasileira de Infectologia, cujos profissionais que a compõem detêm inegável conhecimento técnico sobre o assunto, pois a recomendação dada por ela é diametralmente contrária ao diploma estadual, que autoriza o funcionamento de inúmeras atividades comerciais”, destacou o desembargador.

Orlando Perri ressaltou que o crescimento do número de novos casos é exponencial e, embora haja enorme preocupação com a economia do país e a preservação de empregos – como, a todo momento, se vê nos noticiários locais, nacionais e internacionais –, estes não podem se sobrepor ao direito à vida, que neste momento exige medidas mais restritivas à circulação de pessoas, sendo recomendado, como visto, o isolamento social, principalmente da população idosa. “Na preponderância entre o interesse econômico e o interesse à saúde em geral, deve prevalecer o segundo. A vida é o bem maior do ser humano e a condição para ser tratado com dignidade [CF, art. 1º, II]”.

Segundo o desembargador, é de conhecimento público – e os exemplos mundo afora demonstram – que a pandemia está tomando proporções assombrosas e alarmantes. Projeções mais otimistas mostram que, nos próximos dias, o Brasil contará com mais de 25.000 casos confirmados, podendo tomar proporções geométricas inimagináveis. Também é de domínio público que o Estado de Mato Grosso não possui leitos de UTI para atender sequer a demanda corrente de outras doenças.

A situação se torna mais grave na medida em que, se a doença afetar os pulmões da pessoa acometida pelo vírus, o tempo médio de internação não é inferior a 15 dias. Já a ampliação de leitos de UTI, que o Governo do Estado pretende criar, não estarão disponíveis pelos próximos 20 dias, tempo suficiente para que a pandemia se torne aguda. “Não é preciso ler borras de café para se prever o desastre que pode acontecer em Cuiabá”, reforçou o desembargador.

Processo 1007834-59.2020.8.11.0000.

 Fonte: TJMT